sábado, 31 de maio de 2008

Fim-não-fim


Este é um blog nascido da morte de outros blogs. O último falecido levava este mesmo nome, Defenestrações. O verbo defenestrar significa atirar algo por uma janela. E aqui, de fato, não se via outro nome a dar para uma janela de internet por onde se arremessavam textos dos mais variados tipos (dos ruins aos meia-boca, além de algumas postagens de músicas e uns bons textos de terceiros, gentilmente cedidos ou furtados).

Era um blog assim, simples. Um espaço onde a dona (se assim se pode chamar a quem tem uma página gratuita na internet) defenestrava o que lhe vinha às vezes à cabeça, às vezes ao coração (bonito isso).

Mas é agora assim, um blog abandonado. A dona não mais o atualizará durante um tempo, tanto por falta de criatividade em escrever algo que preste, quanto por falta de vontade em publicar seus últimos rabiscos, em geral, sem muito sentido para quem os viesse a ler... =/

Talvez volte a ser usado. Mas por enquanto, é um blog abandonado.

No momento a criadora (se assim pode-se chamar quem abriu uma conta no blogger e saiu postando textos seus e de outros, além de alguns vídeos e letras de músicas) vai se dedicar a outras tarefas, como os trabalhos da faculdade, as aulas como professora voluntária, o estágio no museu de ciências, o recém-nascido sobrinho e quem sabe alguns artesanatos, quando sobrar algum tempo.

Sendo o que tinha para o momento, agradece pelas visitas recebidas e desculpa-se por alguma postagem esquisita que porventura tenha causado alguma confusão ou mal estar,

a autora (se assim pode-se chamar).

terça-feira, 27 de maio de 2008

Ismália



Quando Ismália enlouqueceu
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...

Alphonsus de Guimaraens (1870 - 1921)

segunda-feira, 26 de maio de 2008

São Paulo


São Paulo é essa cidade de horizonte incerto, de céu cinza, de concreto.
Esse lugar onde há tanta gente e ao mesmo tempo tanta solidão.
Onde sempre existe algo que seja compatível com qualquer: religião, time, idade, orientação sexual, interesse, classe social; e onde apesar disso, as diferenças gritam.
Onde grandes oportunidades se esbarram com grandes furadas.
Onde se compra gato por lebre.
Esse lugar onde as pessoas são tão diferentes quanto iguais.
Onde tudo acontece ao mesmo tempo.
Onde há uma chance de rir e de chorar nas mesmas esquinas.
Onde tudo o que se vê pode não ser alcançável.
Essa cidade onde o céu da noite é triste, com suas estrelas apagadas pela fumaça.
Onde as pessoas se olham, mas nem sempre se vêem.
Essa cidade com milhões de possibilidades, com milhões de destinos, com milhões de pessoas que se deslocam dia e noite, do trabalho para casa e vice-versa.
Essa cidade onde o belo dá as mãos ao feio.
Onde o encantamento dos prédios antigos mistura-se aos espelhos dos novos.
Onde moradores não vivem porque moram na rua.
Onde cada carro abriga um ser individual.
Onde em consultórios psiquiátricos, a angústia é compartilhada em silêncio ou em poucas palavras.
Essa cidade que recebe chegantes de todo o mundo.
Essa cidade que engole as menores, que conurba.
Esse lugar que atrai ao mesmo tempo em que repele, que encanta e que assusta.
Esse lugar que canta, que dança e que joga.
Esse lugar onde tudo pode não ser o que parece, onde o bom pode ser ruim, onde o divertido pode ser enfadonho.
Essa cidade de contrastes e de uniformes. De patrões, de gerentes, de operários, de profissionais liberais, de desempregados e de tudo o mais.
Essa cidade que sofre de insônia crônica, mas que ainda descansa em alguns feriados.
Essa cidade onde seus moradores revezam-se entre amá-la e odiá-la, dependendo de como estão o trânsito, a noite, o ar, os parques, o humor...
Essa cidade onde tudo se encontra, e muita coisa se perde.
Onde nascem e morrem paixões, onde se vivem decepções, onde se alimentam esperanças.
Essa cidade que é palco e platéia, que é protagonista e figurante, que é diretor e contra-regra.
Essa cidade onde há tudo e há nada.
Onde tudo é provável. Onde tudo é possível.
São Paulo é essa cidade, onde embora eu não durma, eu vivo.

E para vc, o que é São Paulo?
Pintura de Tarsila do Amaral

sábado, 10 de maio de 2008

23:20 p.m.

planta sem água. chuveiro frio. balde vazando. torneira pingando. margarina sem sal. doce com recheio azedo. pão velho. calendário do ano passado. meia rasgada. sola gasta. cabelo armado. guarda-chuva quebrado. humor ruim. fita mal gravada. óculos embaçado. vidro trincado. ônibus errado. computador desconectado. teclado desconfigurado. impressora sem tinta. jornal amassado. caderno manchado. livro atrasado. notícia desinteressante. cachorro-quente sem salsicha. bolo solado. pneu furado. mochila com zíper emperrado. sono atrasado. prazo estourado. tudo errado.

domingo, 4 de maio de 2008

Vida


Existe algo que me atordoa, mas não sei direito o que é.

Tem a ver com o ar que se respira; com o trem que lota; com a chuva que alaga; com as pessoas que passam e vão; com as catracas, bilhetes e placas; com carros na contramão; com piadas de mau gosto; com restaurante sem tempero; com almoço de domingo, família, tevê, macarrão, passeio...; tem a ver com o que eu quero dizer mas não sei como; com o silêncio que alardeia; com a indiferença que maltrata; com a resposta que não chega; com a carta extraviada. Tem a ver com o que não cabe nas mãos; com o que esvazia o coração; com o que não faz falta e o que tem precisão.

Tem a ver com a vida e todas as perguntas das quais ainda não sei a resposta (provavelmente jamais saberei). Tem a ver com você que lê isto enquanto imagina se tudo isso faz sentido. Tem a ver comigo, com meus pais, minha irmã, meus amigos. Tem a ver com um deus que existe, mas não para todos e não com o mesmo nome. Tem a ver com o mundo doente e com a natureza cansada. Tem a ver com a paz sonhada, com a violência mascarada e descarada.

O que me acomete talvez seja a perplexidade em relação à Vida e sua louca forma de se descortinar, sua forma de estar calada enquanto tudo explode, enquanto tudo acontece ao mesmo tempo. E sua capacidade de seguir indiferentemente, apesar de tantos impedimentos ou percalços. A Vida e sua mágica fazem-me de vez em quando imaginar o quão importante deve ser cada uma das medíocres vidas que pela Vida passam...