segunda-feira, 15 de junho de 2009

o grito


Era um grito como ninguém jamais havia dado antes. Nele estavam contidos toda sorte de sentimentos que viviam ali presos dentro de si, como se a garganta fosse uma catraca a impedir a saída de seus dizeres a respeito de tudo que via e que lhe despertava opiniões. Enquanto gritava pensava em tudo que não havia feito, nos lugares em que não havia estado, nas conversas que não teve, nas roupas que não vestiu, no cabelo que não usou, nas frases que não falou. Tudo parecia sair ali por aquele grito. Tudo o que foi abafado pelo medo do comentário alheio, da imagem que faziam de si, das conseqüências de se fazer o que se quer.

O grito interrompia o sono dos que estavam por perto. Interrompia o silêncio de uma madrugada que antecedia a manhã de um dia que não seria jamais igual aos anteriores. Interrompia uma calmaria que cobria uma explosão de pensamentos, de idéias, de sentimentos, de vontades, de desafios e curiosidades.

O grito ecoava e se reproduzia dentro de si anunciando que o caminho se abria. E depois do grito olhou ao redor e tudo parecia quieto. O grito apenas a fizera acordar do sonho em que havia estado durante todo o tempo vivido. Foi então que notou que a vida havia passado completamente e a noite calada lhe mostrava que não havia mais tempo. A vida já havia passado.

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